Como praticar o Auto-cuidado durante um tratamento de fertilidade

Numa fase tão exigente como um processo de tratamento de infertilidade, é importante cuidarmos da nossa saúde mental e priorizarmos o bem-estar interior e a relação connosco próprios.

É certo que obter um resultado de gravidez positivo é o grande e último objetivo… mas durante o caminho, muitas vezes, o “eu” é esquecido, acabando por sair fragilizado de todo este processo.

Indico-lhe algumas sugestões de auto-cuidado que poderá adaptar ao seu caso. O importante é perceber o que funciona melhor consigo e não impor algo que não lhe faça sentido e que pode ter o efeito oposto, causando-lhe mais ansiedade e stress.

Todas estas sugestões são ferramentas e competências, que podem (e devem) ser treinadas, e cujos efeitos positivos a longo prazo estão amplamente validados pela ciência. Imagino que, em muitos momentos, não se sinta com capacidade emocional para nada, inclusive cuidar de si, mas lembro que estas ações vêm primeiro do que as emoções, isto é, é o comportamento que lhe vai trazer bem-estar e motivação para continuar.

O importante é começar, com a intenção de pôr em prática pequenas atitudes que lhe tragam bem-estar. Aqui vão algumas dicas:

– Journaling. Escreva um diário sobre as suas emoções ou reserve um bloco de notas com pequenas notas, desenhos, rabiscos emocionais, palavras de amor-próprio, frases inspiracionais ou pensamentos soltos (o ato da escrita ou “journaling” pode ser mentalmente organizador, libertador e catártico para algumas pessoas);

– Respiração. Aprenda a fazer respiração diafragmática, a meditar e a praticar “Mindfulness” (estas são as únicas ferramentas com evidência científica na redução dos sintomas de ansiedade e stress; existem várias aplicações que ensinam a praticar em casa, como a “Headspace” ou “Calm”, que disponibiliza exercícios e um acompanhamento diário – a terapia também ensina estas estratégias);

– Natureza. Mantenha o contacto com a natureza, não desvalorize o poder da mesma pois ela é gratuita e altamente reguladora da nossa ansiedade. No Reino Unido, os médicos psiquiatras podem prescrever literalmente o contacto com a natureza como forma de tratamento. Encontre-se consigo à beira do mar, na floresta, nas brincadeiras de um cão enérgico, ao cuidar de uma planta, em caminhadas ao som do chilrear dos pássaros, sinta o frio e o vento na cara ou a brisa, caminhe de pés descalços ou toque nas flores e árvores. Tenho a certeza que chegará a casa a sentir-se melhor do que quando saiu;

– Limites. Faça escolhas e tome decisões que preservem a sua estabilidade emocional, abandone o “people pleasing”, aprenda a estabelecer limites pessoais e a dizer “não”, proteja-se de situações que ativem os seus gatilhos;

– Discurso interno. Seja a sua melhor amiga e procure um discurso interno carinhoso e empático; cultive uma relação de gentileza e auto-compaixão consigo mesma, como se de uma melhor amiga se tratasse;

– Autoconhecimento. Ressignifique a sua dor através do auto-conhecimento e da transformação empoderadora que a infertilidade pode trazer. Tome este momento a seu favor, aproveite-o como uma oportunidade para se conhecer profundamente, para se compreender e, sobretudo, criar uma nova relação consigo e com os outros;

– Outros projetos de vida. Aprecie todas as suas conquistas nas diferentes áreas da sua vida e mantenha outros projetos importantes para si;

– Movimente o corpo. Pratique exercício físico (mantenha-se em movimento: seja com caminhadas, aulas de yoga, pilates… o que mais gostar), dance em casa ao som de uma playlist de que gosta, abane o corpo para exteriorizar emoções (mesmo que lhe pareça estranho e ridículo). O seu corpo é a sua casa, torne-o um lugar seguro e confortável para se viver;

– Grupos de suporte. A partilha saudável de testemunhos de pessoas que passam por experiências semelhantes e com as quais se estabelece uma relação de identificação, empatia e entreajuda, tem um efeito terapêutico fortíssimo, prevenindo o isolamento e vergonha característico da infertilidade; mas fique atenta: evite grupos que estimulem a desinformação, o negativismo e a obsessão pela infertilidade;

– Sinta tudo o que houver para sentir. Permita-se sentir a sua dor sem querer mudá-la ou suprimi-la. Haverá momentos em que precisa de estar sozinha, em que não se sente tão capaz, em que não reagiu tão bem como gostaria, em que lhe apetece chorar ou mesmo gritar – identifique as suas emoções, valide-as e aceite-as, dê espaço para que se manifestem e para que se vão embora, sem julgamentos. As emoções têm um período de atuação curto, elas não ficam em si, apenas passam por si como visitantes;

– Descanse. Tire momentos para não fazer rigorosamente nada, para se libertar de responsabilidades, e para estar só consigo mesma e com os seus pensamentos – não temos de ser produtivos todos os dias e de estar sempre “online”. Escolha também atividades que lhe permitam um “descanso ativo”, por exemplo, ler, cozinhar, costurar, ouvir música, etc.;

– Lembre-se de quem é. Antes de tudo isto começar, antes das tentativas de engravidar, antes das consultas, como era a pessoa antes da infertilidade? Não se esqueça que um diagnóstico não a define;

– Faça algo pelos outros. Pratique ações dirigidas aos outros. Voluntariado, hobbies, … dedique algum do seu tempo aos outros, isso vai ajudá-la a socializar, a sentir-se útil, realizada, e a aliviar a sua mente do constante pensamento em torno da fertilidade e do futuro;

– Comprometa-se consigo mesma. Crie rotinas e hábitos saudáveis. Se falhar a si mesma, retome a intenção do compromisso logo que possa, sem julgamentos. O autocuidado começa por ser algo que fazemos a custo, depois aos poucos torna-se um hábito e um compromisso para connosco. Com consistência, ao longo do tempo, ele acaba por tornar-se parte da nossa identidade. Por isso, apaixone-se por cuidar de si!

– Seja flexível. Seja exigente a cuidar de si, sempre com uma atitude de compreensão de base, sem se cobrar e culpar; se hoje não correu tão bem, amanhã será uma oportunidade para ser melhor;

– Pouco é melhor que nada. Comece com pequenos hábitos, alcançáveis e razoáveis. A ideia é fazer o que puder e conseguir, ao seu ritmo, sem dar espaço para a autocrítica;

– Procure retirar algo de positivo. Apesar da experiência da infertilidade poder ser extremamente desafiante e dura, faça um esforço por encontrar algo de positivo em todo este processo;

– Continue a sonhar.  Mantenha uma postura esperançosa e de que “o melhor está sempre por vir” na vida. Mime-se e sinta-se merecedora de coisas boas;

– Ajuda especializada. A terapia é essencial no autocuidado na infertilidade. Um psicólogo poderá ajudá-la a tornar o caminho mais leve.

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